Sempre que vou a Gramado o Nonno Mio é parada certa para almoço ou jantar. E não é só pela boa comida italiana, feita de forma artesanal com ingredientes de verdade, mas também pela recepção de um gaúcho gente boa, que virou amigo, Felipe Andreis.
40 anos de Nonno Mio – Senta que lá vem história
Então, tudo começou com o Fernando, que o Felipe chama de avô, mas que, tecnicamente não é seu avô, aquelas familiaridades que todo mundo bem conhece. Afinal, quantos primos que não são primos, tias que não são tias, colecionamos ao longo da vida?
Pois é. O Fernando gostava de fazer e preparava muito bem galeto para os amigos. Aprendeu pegando dicas na tradicional Galeteria Alvorada, que existe até hoje em Caxias do Sul. Era frequentador assíduo do local.
E lá vieram os amigos dizendo que cozinhava tão bem que deveria abrir um restaurante. Fernado abriu, não só um, mas três, em Gramado, Porto Alegre e São Leopoldo. Surgia o Nonno Mio em 1982.
Acontece que ele descobriu que adorava cozinhar para os amigos, mas detestava ter restaurante. E então, disse aos filhos que se não quisessem tocar o negócio fecharia todas as casas.
Tio Pedro
Enfim, Fernando deu um restaurante pra cada filho e o Nonno Mio de Gramado ficou com a Tia Lei (Marilei Carbelon Andreis), esposa do tio Pedro.
Vejam só como são as coisas, de tanto ouvir o Felipe falar tio Pedro, para esse que vos escreve, ele já é, igualmente, tio Pedro.
Continuando a história, tio Pedro assumiu o Nonno Mio, que na época funcionava apenas como rodízio de galeto al primo canto e foi imprimindo a sua marca de um apaixonado pela cozinha.
As casas de Porto Alegre e São Leopoldo fecharam, mas o Nonno Mio de Gramado continuou firme contando a história do fundador Fernando.
Tio Pedro chamou seu irmão Mário, pai de Felipe, para tocarem juntos o negócio, que sempre foi um sucesso, tanto pela comida, quanto pela recepção calorosa que os irmãos proporcionavam aos clientes.
Clientes que, ao longo dos anos, se transfomaram em amigos. Enfim, a amizade estava no DNA do Nonno Mio desde a fundação.
Felipe aos doze, treze anos já dava expediente no restaurante, ajudando o tio e o pai, no caixa e onde mais fosse preciso.
Associação dos Restaurantes da Boa Lembrança
Até 2005 o Nonno Mio era sobretudo uma galeteria. Mas, em virtude da entrada nesse ano na Associação dos Restaurantes da Boa Lembrança começaram a criar pratos à la carte.
Para quem não conhece, a Boa Lembrança é formada por um grupo de restaurantes selecionados, que a cada ano preparam uma receita especial diferente.
Ao visitar o restaurante e pedir o Prato da Boa Lembrança, o cliente leva de presente uma peça exclusiva em cerâmica feita à mão, como uma lembrança de uma deliciosa refeição.
Taverna Del Nonno
Posteriormente à introdução dos pratos à la carte por causa da Boa Lembrança e atendendo a pedidos de clientes que começaram a pedir outras opções, surgiu ao lado do Nonno Mio, com menu internacional, cozinhas e entradas separadas, a Taverna Del Nonno.
Dessa forma, quem quisesse o galeto iria no Nonno Mio e quem desejasse provar os pratos da Boa Lembrança e os demais à la carte poderia frequentar a Taverna Del Nonno.
Acontece que, o que se planeja e o que acontece são duas coisas muitas vezes diferentes, porque existe um fator chamado: cliente. Por exemplo, chegava uma mesa de dez pessoas no Nonno Mio, oito queriam o rodízio de galeto, mas duas desejavam os pratos à la carte da Taverna Del Nonno. Qual o problema? Pertenciam aos mesmos donos e era um ao lado do outro, não é verdade?
Então, dá pra imaginar que os pratos das duas casas, até pelas características peculiares de cada uma, vindos de cozinhas diferentes, não saíam ao mesmo tempo. Ou seja, os rodízios de galeto começavam a ser servidos, antes dos pratos à la carte chegarem na tal mesa de dez pessoas.
2013 – Ano de Transformações
Da mesma forma que promoveram mudanças para montarem duas cozinhas e dois restaurantes diferentes, um ao lado do outro, os irmãos Pedro e Mário Andreis, decidiram unificar as casas.
Promoveram uma reforma deixando apenas uma cozinha e um restaurante. Mantiveram o Nonno Mio, agora com menu que contemplava não só o rodízio de galeto, como também os pratos à la carte.
Melhoraram muito a experiência dos clientes, que poderiam num só lugar optar por pratos diferentes. Inclusive, a mesa toda seria atendida ao mesmo tempo.
Outra decisão foi, a partir do novo menu, oferecer também os galetos empratados. Não seria mais preciso pedí-los apenas no rodízio. Uma demanda dos clientes por refeições mais leves.
Na esteira das mudanças, Felipe Andreis, terceira e atual geração da família a administrar o restaurante, assume o Nonno Mio de Gramado, ao lado do tio Pedro e do pai Mário, que a essas alturas já pensavam em se aposentar, mas queriam fazer uma transição tranquila. Tanto que Pedro saiu em 2015 e Mário apenas em 2017.
Tio Pedro e Felipe Andreis na horta do Casarão do Nonno.
Felipe Andreis
A partir de 2017 Felipe começou a administrar o restaurante sozinho, porém desde a sua chegada foram muitas as transformações. A começar pela unificação dos restaurantes, cozinhas e cardápios.
Norteando seus pensamentos sempre esteve a preocupação com a autenticidade e a regionalidade.
Por exemplo, para ilustrar um dos seus desafios, com a cozinha internacional criada pela Taverna Del Nonno, um dos itens do cardápio era Salmão com molho de Camarões. Prato que, num primeiro momento, permaneceu na unificação do menu com o Nonno Mio. Claro que os clientes gostavam, mas para ele não fazia qualquer sentido manter na carta um prato com dois ingredientes que viajavam congelados de longas distâncias e nada tinham a ver com a cozinha italiana da Serra Gaúcha.
Vieram novos pratos à la carte, outros se foram. Chegaram os galetos empratados, além do rodízio, mas a essência do restaurante foi preservada.
Patrimônio Histórico e Cultural do Rio Grande do Sul
Hoje, completados 40 anos de Nonno Mio, Felipe já sabe que o restaurante se consagrou como autêntico italiano da Serra Gaúcha.
“São as nonnas cozinhando, as massas feitas na casa, o galetinho, a polentinha, a maionese, tudo feito aqui. A mesa farta, isso tudo tem a ver com o italiano da Serra” – me diz ele.
Em 2021, a cozinha colonial italiana tornou-se pelo Projeto de Lei 421/2021 aprovado por unanimidade na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, patrimônio histórico e cultural gaúcho.
Essa cozinha autêntica italiana da Serra Gaúcha é aquela que os imigrantes desenvolveram quando chegaram misturando o conhecimento trazido na bagagem com os ingredientes encontrados no local. É algo singular, que não se encontra na Itália.
A Cozinha do Nonno Mio
O cuidado com os ingredientes e a procedência de cada alimento sempre foi uma preocupação da família.
Hoje boa parte das saladas, ervas e temperos são plantados e colhidos por eles. Bem como as massas artesanais e pães, servidos no restaurante saem da cozinha instalada no Casarão do Nonno, que fica em outro local. Por lá tio Pedro ainda dá expediente. Mário, pai de Felipe, infelizmente os deixou durante a pandemia de Covid.
Os capeletti, que chegam quentinhos servidos no brodo desde o início, continuam sendo fechados à mão um a um.
O bacon e outros embutidos, igualmente são produzidos no Casarão.
Enfim, os insumos que não vêm da produção familiar são adquiridos de produtores locais, de outras famílias comprometidas com a qualidade.
Galeto al Primo Canto
Antes de mais nada, o Nonno Mio ficou famoso pelo seu Galeto al primo canto – rodízio farto que, além do galeto, serve pão artesanal e azeite temperado Nonno, sopa de capeletti, polenta brustolada, salada de maionese (sem ovos, receita criada pela família), salada de radicci com bacon artesanal (eles fazem o próprio bacon da criação de porcos).
No capítulo das massas: Espaguete ou tortéi com os molhos à escolha: sugo, molho da casa, bolonhesa, alho e óleo, quatro queijos, manteiga, ao pesto. Bem como, macarrão à capo du mont, nhoque aos quatro queijos, tortelini de goiabada ao molho de gorgonzola e lasanha à bolonhesa.
Enfim, para a sobremesa é possível escolher entre Pudim e Sagu com creme.
À la carte
A casa oferece uma variedade de pratos à la carte: carpaccio, salada a caçador (folhas verdes e coelho), polenta a la brace (feita na brasa) servida com pesto, massas diversas, filé à parmegiana, paleta de cordeiro, risotos.
E, para aproximar o restaurante da cozinha autêntica da Itália, Felipe começou a investir em pratos feitos com massa de grano duro.
“O Linguine Cacio e Pepe que a gente tá fazendo agora é exatamente isso, uma massa grano duro. A gente tá escrevendo no cardápio, não é uma massa que a gente faz aqui, é uma grano duro específica pra eu fazer o Cacio e Pepe” – conta Felipe.
Já o Espaguete Carbonara com bacon artesanal, gema de ovo e pecorino é uma homenagem ao seu pai.
Há opções sem glúten, sem lactose e vegetariana.
Cabe destacar que um dos principais motivos para que as massas e pães fossem produzidos no Casarão do Nonno e não mais no restaurante, foi por causa da intolerância de várias pessoas ao glúten.
“Assim, pelo menos, não temos farinha no ar” – me disse ele.
E hoje, isso é um grande diferencial pensando nos inúmeros restaurantes das redondezas.
P.S. 1 – não deixe de pedir a Carta de Vinhos, o Felipe é apaixonado por vinho e oferece sempre uma seleção bacana em sua adega.
P.S.2 – Foi lançado um livro comemorativo dos 40 anos do Nonno Mio.
Acesse o site do restaurante.
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Fotos: Paula Vinhas
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